quinta-feira, setembro 18, 2008

Dia 55 - Alguém me dá um Dó?

Pois bem, hoje apeteceu-me pegar nisto e escrever qualquer coisa, porque não consigo falar (blame it on the flu).

Sabem aqueles dias em que achamos que vamos dizer alguma coisa de importante e por isso é importante falar, embora saibamos que de facto não vai sair grande coisa, e alguém depois vai dar o seu tempo por perdido por ter estado meia hora a olhar para um conjunto de disparates e censurar-se por acreditar que de facto algo de diferente poderia sair dos dedos deste maluco, que tivesse de facto interesse? Eu também não, nunca passei por uma situação dessas, mas se souberem de alguém (sem contar com o Badaró), estejam à vontade para dizer.

Vou escrever sobre algo de que gosto particularmente. Música.

A música que se ouve em Portugal intriga-me. Quer dizer, a música que se compra em Portugal assusta-me. Melhor, tenho medo do panorama musical português. Ou receio. Ou pavor. Talvez temor. Mas chega de brincar à semântica, se Shakespeare fosse português, hoje teria escrito "Há algo podre no reino da música em Portugal. Ou então sou eu que preciso de mudar de collants". E é provável que tivesse razão. Porquê?

É simples, basta ver os álbuns que estão no top da AFP - Associação Fonográfica Portuguesa. Eu podia acabar o texto aqui (há pelo menos 4 pessoas que concordam comigo nesta questão, e o meu gato Arnoldo chegou mesmo a sugerir que apagasse todo o Blog, mas eu não liguei), dada a inexistência de palavras para definir quão atónito fico sempre que vejo o programa Top+. Mesmo assim vou tentar dizer alguma coisa, e vamos lá a ver o que sai.

Engane-se quem pensa que as editoras, as grandes empresas discográficas e os grandes empresários que percebem muito de marketing mandam nisto. Não tenhamos dúvidas: quem manda no que se compra são... os putos. Porque duvido que mais alguém oiça, por exemplo, os melhores êxitos do Ursinho Gummy enquanto conduz, ou cantarole (belo verbo este, hã?) o refrão d' A Ritinha (tem um ratinho)... enquanto corta carne do novilho para assar. São eles... os "piquenos", que mandam. Ou isso ou então é porque esses cds são os mais baratos. É capaz de ser isso.

Mas esta nova vaga de música para crianças, que na verdade é composta na sua maioria por reedições de músicas antigas, cujos vídeos têm animações dignas de competir nos paralímpicos, trouxe consigo uma mudança no pensamento de alguns artistas da dita música a "sério". Já não basta cantar bem, ter um bom compositor e uma banda competente. Isso até nem é preciso hoje em dia. Muita coisa tem mudado e há uma questão que insiste em colocar-se no meu âmago, e até noutros sítios:

Videoclips em 3d - Serei o único a achar isso estranho?

O Avô Cantigas foi um pioneiro (e todos sabemos que é difícil ser pioneiro em alguma coisa quando se tem a idade do Carlos Vidal) ao decidir pendurar as jardineiras da vida real e deixar o seu alter-ego virtual tomar conta das coreografias. A partir daí, foi sempre a descer. Alguém achou aquilo uma boa ideia e decidiu trazer para Portugal personagens que já andavam lá fora a espalhar "magia" (a minha definição de "magia" também engloba o conceito "irritar como se não existisse o amanhã"), nomeadamente um tal de "golfinho Vicky", uma "bebé Lilly", o supra-citado "ursinho Gummy" e outros, cuja minha notória falta de cultura nesta área impede de referir com mais assertividade.

No entanto, posso tirar algumas conclusões destes exemplos: Para ter sucesso é importante ser um bicho e ter o nome a acabar em Y.

Se isto ficasse por aqui, seria apenas desastroso. Mas num glorioso dia, de má memória para quem tem olhos que funcionem, alguém pensou que podia usar esta cena do 3d para dar um "efeito giro" a vídeos cujas músicas que não têm piada nenhuma. E assim decidiram fazer representações de toda a banda em 3d, com movimentos dignos de um pensionista em reabilitação após operação à anca. O produto final acaba por chamar à atenção, porque apela à curiosidade. A mesma curiosidade que nos leva a abrandar quando há um acidente na estrada. Sabemos que aquilo não é bonito, mas não queremos desviar o olhar.

Há ainda aqueles artistas que, mesmo sem vídeos que recorram à animação 3d, ficam no Top semanas a fio, mas ninguém percebe porquê. Começando pelas cíclicas boys e girls band, que só mudam a embalagem, mas não variam o conteúdo, passando por aquelas artistas que fazem todo o sentido quando pomos a televisão em "mute" e acabando naqueles miúdos pubescentes que saem disparados de alguma série da Disney.


Queria terminar com uma carta que quis enviar, mas como não sei a morada, deixo aqui, pode ser que o destinatário a leia:

Remetente: JK
Destinatário: O senhor que inventou o "Joka, o Fantasminha"

Caro senhor, antes de mais queria dar-lhes os parabéns por existir há tantos anos e ainda manter a capacidade da fala e, ainda mais importante, embora por vezes desvalorizada, a capacidade de respirar. Queria ainda dar-lhe os parabéns por todos os aniversários que já completou até à data, que decerto serão bastantes, mas não quero com isto chamar-lhe velho, até porque uma pessoa da sua dimensão terá decerto um nome bem catita, dado pelos seus progenitores biológicos e/ou legais.

Mas vamos ao que interessa, não sei se já o fiz nesta carta, mas queria dar-lhe os parabéns. Por tudo, mas também pela sua ideia do "Joka, o Fantasminha". Realmente é necessário quebrar os trâmites convencionais da música de hoje em dia, e nada melhor que usar um fantasma, um ícone associado à morte, e transformar todo esse conceito, alicerçado ao longo de tantos anos na cultura popular através de histórias e dos filmes de terror, num êxito para a "pequenada". Acredito que não tenha sido fácil, principalmente depois do Avô Cantigas ter usado a sua influência para diminuir o poder terrífico de tão digna personagem, ao alegar, e cito: "fantasminha brincalhão/ não me metes medo não/ gostas muito de fazer bu bu bu bu".

Mas os desígnios do mundo da música portuguesa são insondáveis, e o senhor conseguiu, e já agora parabéns. E a ideia do nome... "Uau" é a única palavra que me ocorre.

Para o congratular convenientemente, decidi enviar há uns dias uma encomenda para a sua editora, para ser aberta apenas pelo senhor. Não será necessário passar o meu presente pelo detector de metais. Ah, e não tenha medo do "tic-tac" que se ouve, a sua curiosidade será satisfeita assim que abrir a embalagem.

Parabéns.





E descanse em paz.