sexta-feira, julho 18, 2008

Dia 53 - E chegou, chegou a... - Parte II

Aviso prévio ao leitor: Se não leu a parte anterior, vai arder no Inferno. Ou se calhar só fica um bocado crestado pela labareda, mas vai doer.

O "copo de água".

Os convidados seguem nas suas viaturas para o local do coiso, com aquela... digamos... paneleirice do paninho na antena, para ninguém se perder. Faz sentido, porque se eu me quisesse perder, não quereria ter aquela porcaria pendurada no carro. No entanto algumas pessoas deixam aquilo no carro, meses depois do casório. Porquê? Não sei, mas é parvo.

E sobre o nome "copo de água", acho que é altura de encararmos a realidade: Ninguém bebe água ali. Isto é só uma sugestão, mas que dizem de "Enfardanço à bruta"? O nome "copo de água" faz sentido no dia seguinte, no sentido de tomar um "copo de água" com algum anti-ácido, para a azia... não sei, é só uma sugestão.

Mas é no copo de água que surge aquela que será a personagem principal no resto do dia: O homem do teclado. Não se iludam, por esta altura já ninguém quer saber dos noivos. O senhor do teclado e do microfone com eco é que manda.

"Quero pedir uma grande salva de palmas para os noivos, faxabôre!" - Ele pede apenas por uma questão de cortesia, porque sabe que ninguém se atreve a questioná-lo. Há até rumores de alguns casamentos que se ficaram por ali porque alguém se esqueceu de bater as palmas ou porque tinha as mãos ocupadas.

"Agora vou dedicar esta música aos noivos" - O homem até pode esfolar um gato à frente do casal, este vai ter que sorrir e bater palmas no fim.

"Agora ia pedir um brinde aos noivos e queria que cada um fizesse um pequeno discurso no final. Ah, e depois o noivo vai regar-se com 'pitróil' e saltar através de um arco em chamas e a noiva vai recitar de cabeça a edição das Páginas Amarelas de 1963, da secção de 'Criadores de gado' à secção de 'Tubagens e Tubos', faxabôre." - Tem de ser, noivos. O homem é que manda. Ninguém come enquanto não disserem alguma coisa.

É certo que são os noivos que lhe pagam, mas o TT - Tirano do Teclado, é que decide.

Finalmente, chega a comida e temos a oportunidade de conviver com as pessoas que se sentaram à nossa volta. Aqui é que se esconde o segredo de um copo de água com sucesso: a colocação dos convidados. É provável que fiquemos junto de pessoas com as quais não convivamos muito, mas por alguma razão, no final do evento, vamos dar-nos muito bem. Eu não tenho uma explicação lógica para este fenómeno, mas deve estar relacionado com algum destes factores:

a) A fome.
b) O álcool
c) O facto de não ouvirmos mais ninguém por causa do raio do cd dos "Pan Pipes" que o TT pôs a tocar em loop.
d) Uma combinação sórdida das letras prévias, não necessariamente nesta ordem.

O grupo de pessoas com quem tenho ido a casamentos prende-se maioritariamente com o núcleo familiar - os meus pais e o meu irmão, mas há quem vá como "amigo dos noivos", sem qualquer ligação familiar. E é assim que é formado o grupo mais divertido e rebelde do casamento - Os barraqueiros. São estes os únicos que conseguem - e podem - fazer mais barulho que o senhor do teclado. Eles vão brindar 15 vezes de cada vez que um dos noivos se levantar para ir à casa de banho. Eles vão esperar que o noivo tenha um pedaço de couve nos dentes para se levantarem e dizerem: "Beija! Beija! Beija! Beija! Beija! Beija!". Enquanto batem com um talher no copo. - Nada romântico. Eles vão ser os primeiros a embriagar-se e os últimos a terem noção disso. São eles que, no fundo, fazem do casamento uma festa e uma dor de cabeça ao mesmo tempo.

Há ainda a mesa do pessoal mais velho, que assiste àquilo tudo com a passividade impávida de quem já passou por muitos casamentos e que sabe que tudo aquilo é passageiro. Não me refiro ao casamento, claro, isso até pode durar muito tempo, mas tudo, tudo é passageiro, estão a ver? A essência, a verdade de tudo... aquela cena que eu não faço a mínima ideia do que será, porque ainda sou novo.
Enfim, aquela sabedoria que só muitos anos e ainda mais casamentos pode trazer a alguém.

Chegam as entradas. Vão-se embora. Chega o primeiro prato. Vai embora o primeiro prato. Chega o segundo prato. Vai embora o segundo prato, chegam o bolo da noiva, as sobremesas e os aperitivos e mais não sei quê... eu até percebo que se queira fazer uma festa, com abundância e tal, mas come-se... mesmo muito. Há sempre alguém que trata as travessas por "tu" e chega ao fim com "um ratinho no estômago". Felizmente são raros, caso contrário os noivos passariam a lua de mel a lavar pratos.

O "after-food", que em português significa "Depois do enfardanço", é aquela fase em que o "Lord of the Keyboards" exerce o seu domínio. Chama as pessoas para dançar - Sim, depois de ingerirmos o nosso peso em bifinhos com cogumelos e bacalhau com broa temos de ir para o espaço em frente ao Senhor para dançar. E se não formos, eventualmente seremos alvo do olhar penetrante e punidor do tal sujeito. E aqui entra o declínio: êxitos do panorama musical popular português (PMPP - parece a sigla de um novo partido político. Aqui faz sentido se nos quiserem dar baile), êxitos no geral, êxitos no particular, êxitos da música latina, reggaeton, e tudo que passar na cabeça do senhor... não pode haver contestação. Raios, se ele começar a cantar fado, é para dançar e mai' nada! E não se coíbam de fazer aquelas coreografias das discotecas! E se começarem a mandar bitaites lixo-vos com o comboínho!

O comboínho é algo de extremamente estranho. Pessoas em fila, a imitar um comboio e a andar à volta das mesas, enquanto batem palmas e cantam alguma coisa... geralmente o "Apita o comboio". É a música oficial do comboínho. Os italianos podem orgulhar-se da Mona Lisa. Os franceses podem orgulhar-se da Torre Eiffel. Nós temos o comboínho, venham eles!

Ok, eu até posso estar a exagerar... mas não estou.

E ainda há a acrescentar o... karaoke.

(Pausa para expressão de dor)

Pior do que karaoke só... (podem pôr nos comentários o fim desta frase, seria giro) ... as pessoas que gostam de karaoke. E elas existem. E se lhes acrescentarmos a desinibição etílicamente provocada, ficam ainda mais irritantes, porque não têm medo de desafinar. Até insistem nisso. E depois arrastam os amigos e tomam o monopólio do micro... a única coisa que os pode tirar dali é uma cadeira na testa ou uma catástrofe natural.

Nesta altura o desespero já toma conta de muita gente. Pelo menos daqueles que não beberam o suficiente (o que geralmente é o meu caso, como vou com a família, não posso abusar... ele há coisas chatas), e a definição de suficiente, nestas ocasiões, calcula-se em cerca de 10 vezes a noção do legalmente permitido, ou seja, a um Mon Chéri do coma alcoólico. E este desespero é o semelhante ao de algumas raparigas (e sublinho o "algumas") aquando do lançamento do bouquet da noiva. Às vezes há feridos. Não sei quem foi o génio que se lembrou de inventar a ideia de que a rapariga solteira que apanhar o bouquet da noiva será a próxima a casar. Isto é o "major turn-off" do namorado da dita. Ele não vai passar o resto da tarde sossegado. É nesta altura que ecoam pela sala os parabéns das amigas da rapariga e os pêsames dos amigos dele.

Eu gostava de fazer uma sugestão, quem sabe seja criado este costume:
Que tal pegarmos no conceito do lançamento do bouquet no casamento, retirarmos o bouquet, retirarmos a noiva, retirarmos o casamento, retirarmos as raparigas solteiras de quarentas-e-muitos-mas-que-insistem-em-dizer-a-toda-a
-gente-que-têm-apenas-vinte-e-poucos-embora-o-bilhete-de
-identidade-não-minta-e-as-faça-sentir-que-se-desejarem
-mesmo-serão-jovens-para-sempre-mas-queridas-a-cena-dos
-desejos-só-funcionou-com-o-Aladino-mas-como-o-tipo
-usava-umas-sandálias-esquisas-a-cena-lá-se-compôs E acrescentarmos uma botija de oxigénio, um lar de 3ª idade, muitos pensionistas e a ideia de que o primeiro a apanhar a botija será o próximo a morrer? Eu sei, é arrojado. Portugal provavelmente não tem dimensão suficiente para uma inovação destas, mas pode ser que alguém pegue nisto.

E para acabar, quero desejar os parabéns aos noivos do casamento ao qual fui. Eles sabem quem são, e sabem que gosto muito deles. É pouco provável que leiam isto ou que, caso leiam, voltem a falar comigo depois deste texto (ou não), mas pronto, vocês são os maiores :p

E em relação aos jovens casais... bem... aos casais que pretendam casar, boa sorte com isso, não se esqueçam de me convidarem para a despedida de solteiro mas por favor esqueçam-se de me convidar para a tortura do "after-food". A não ser que em vez do TT (e não me refiro ao Audi) esteja uma Salma Hayek ou um par de Jessica(s) Alba(s). Aí podem contar comigo para a Macarena.




P.S: Lembrei-me deste detalhe... antes da cerimónia começar, o senhor do teclado pôs como música de fundo a "Yesterday" dos Beatles... acho que não é preciso dizer mais nada.




P.S.2: Eu confesso, sou absolutamente contra o novo (que não é assim tão novo, mas adiante) acordo ortográfico, mas é a única forma de mandar esta piada, por isso cá vai:
- O casamento é uma união de fato... e gravata.



(eu sei... fraquinha...)




Tenham medo. Muito medo.

quinta-feira, julho 17, 2008

Dia 52 - E chegou, chegou a... - Parte I

Aviso prévio aos leitores: este texto vai ser grande.

Hoje vou tentar escrever sobre alguma coisa, para variar. Há coisa de uns dias atrás estive presente numa cerimónia à qual algumas pessoas chamam de "casamento". E não é novidade nenhuma que se há um sítio propício para que coisas estranhas existam, o casamento é um grande candidato. "E por onde começar?" - pergunto eu aos meus botões.

Como eles não respondem, vou começar pela primeira coisa que me vier à cabeça.

Pensando bem é capaz de ser melhor começar pela segunda coisa que me vier à cabeça, dado que a ideia de uma roda cúbica interessa a muito pouca gente (eu incluído).

O casamento é uma festa. Que geralmente começa com toda a gente, menos os noivos, porque é suposto estar lá toda a gente à espera dos ditos. Mas até agora tudo bem, nós já sabíamos com que contar quando recebemos o convite. E lá está algo que é bastante interessante.

Comecemos então pelo convite. Geralmente é-nos entregue um envelope todo jeitoso no qual está um papel de elevado grau de "catitice" anunciando a data e local do casamento, assim como os principais intervenientes, ou seja, a sub-gerente do departamento de afiação de lápis e o senhor que escolheu as cortinas. Alguns destes convites optam por uma via mais alternativa e radical e, imitando aqueles tipos que teimam em contar o fim do filme quando este ainda vai a meio, escarrapacham ali o nome dos noivos, para grande surpresa de quem recebe o supra-referido documento. O convite em si não tem nada de especial, e brincar com este assunto pode parecer parvo (e é mesmo) mas há algo que persiste na minha mente:

- Se as osgas um dia ganhassem asas e decidissem dominar os céus no geral e o comércio de pêssegos no particular, será que o programa espacial europeu teria de ser modificado ou ficaria apenas permitido o seu acesso aos cidadãos com televisão por cabo?

Após o convite é suposto dizermos se vamos ou não. Para efeitos pedagógicos (ou talvez não, porque aqui não se aprende nada), vamos supor que dizemos que sim.

E lá vamos nós. E o dia do casamento é aquele dia em que sabemos que vamos ter de sair de casa com um aspecto algo cuidado. Eu estive a investigar sobre este assunto e um especialista na matéria disse-me, e cito: "Por favor não me deixes cair da varanda abaixo, o dinheiro está na mesinha do telefone. E já agora, o aspecto algo cuidado necessário para irmos a um casamento deve variar de acordo com o gosto da pessoa, mas algo que não leve a que sejamos baleados ou confundidos com um canteiro geralmente basta para sermos aceites. Aaaaaaaaaaaaaaah.... "

Se formos um gajo (como é o meu caso), lá procuramos um fato que esteja limpo e/ou que não cheire assim tão mal (o que geralmente é fácil, se não tivermos assim tantos fatos, como é o meu caso), engraxamos os sapatos, fazemos a barba, penteamos o cabelo, damos de comer ao cão, à iguana, ao gato e ao perú, tomamos o pequeno-almoço, lavamos os dentes e depois de estarmos vestidos e preparados para sair vamos ter com as senhoras (mãe, tia, namorada, avó, amigo com gostos "alternativos", etc...) que nos acompanharão à cerimónia, que acordaram 2 horas antes de qualquer ser vivo no planeta e se dirigiram ao cabeleireiro para tratar do penteado, das unhas, das sobrancelhas, das pestanas, das orelhas e de outra coisa qualquer que entretanto se lembrem, isto depois de terem passado mais ou menos uma semana a escolher a sua indumentária para a ocasião, nomeadamente, brincos, sapatos, vestido, lenço, o perfume, etc, etc e etc... e ainda etc.

E quando chegamos ao local e começamos a cumprimentar as pessoas que já lá estão, surge o primeiro grande problema: É raro conhecermos toda a gente. E convivemos regularmente com uma pequena parte das pessoas que conhecemos. O que nos obriga a recorrer à dita conversa de ocasião, geralmente subordinada à temática das pescas e do clima, assim como ao desempenho desportivo do nosso clube em determinado embate ou mesmo no geral. E se tudo isto falhar, podemos sempre optar pela crítica da situação política actual, nomeadamente com frases do género: "Isto é sempre a mesma coisa, pá. Quando estão em campanha prometem mundos e fundos e depois não fazem nada. Só querem o poleiro, os bandidos, pá!" - O substantivo "pá" dá bastante jeito, porque não queremos admitir que não nos lembramos do nome da pessoa com quem estamos a falar... mas continuando.

Após algum tempo, que varia na ordem dos minutos, chega o noivo. Cumprimentamos o rapaz com o mesmo olhar que damos ao presidiário no dia da sua última refeição e este, após os abraços e beijinhos dirige-se para junto do padre ou do senhor do Registo Civil. O noivo é geralmente posto em segundo plano, porque até ele espera pela noiva. Dizem que isso tem raízes culturais. Deve ser por isso que todos nós criamos raízes enquanto esperamos pela chegada da noiva, que varia na ordem das horas. Algumas pessoas não conseguem esconder o seu alívio quando a noiva chega e até batem palmas. E para disfarçar dizem: "Está tão linda."

À frente da noiva vai o único miúdo(ou míuda) que não faz a mínima ideia de onde está: o menino das alianças. Estou para ver o que acontece se um dia o puto começar a fugir nessa altura. Deve ser por isso que só escolhem crianças de pouca idade para fazer isso. Têm pernas pequenas e não chegam muito longe.

- Enquanto a noiva caminha para o altar, é posta a tocar a "Marcha Nupcial", originalmente composta por Wagner para a peça (ou lá que seja o nome a que dão a estas coisas) "Lohengrin". Há quem diga que existem algumas semelhanças com a marcha fúnebre de Chopin, o que não deixa de ser giro, porque há alguma coisa que acaba naquele dia, nem que sejam os lenços de papel das apelidadas "choronas". -

A cerimónia então começa, geralmente nesta altura não consigo ouvir o que o senhor está a dizer aos noivos, porque estou atrás da primeira fila, mas deve ser algo importante. E após aquela conversa, o orador lá decide aumentar o volume da sua voz para dizer

- "(inserir nome do noivo), aceitas a (inserir nome da noiva) como tua legítima esposa?
Noivo - Pode ser.

- "(inserir nome da noiva), aceitas o (inserir nome do pobre do noivo) como teu legítimo esposo?
Noiva - ...

E aqui alguns sustêm a respiração, porque a noiva pode dizer que não. Pode? Isso até acontece nas novelas e em alguns filmes, mas na vida real... hmmm... não me parece. A festa não é assim muito barata e convidar aquela gente toda para dizer "Não" é um desperdício de acepipes.

E então eles casam. Todos batem palmas e atiram o arroz aos noivos, a representar os desejos de prosperidade e fertilidade ao novo casal. Eu acho que, tendo em conta o preço dos cereais, seria recomendado atirar o arroz... dentro do pacote. Os noivos podiam não gostar, mas era giro. E económico.

Depois, o "copo de água".

Mas isto fica para o próximo capítulo, publicado já de seguida.